segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Contas

Eram de pérolas, as contas.
Tão pálidas...
Partiram-se do fio.
Uma a uma, caíram ao chão.
Caíram cheias de beleza,
cadenciadas,
numa dança ritmada.
Espalharam-se entre os aromas,
entre os suspiros e os espantos.
Desenharam linhas transparentes
e amarraram os olhares atentos.
Enfeitiçaram as rendas e as plumas
e seguiram intrepidamente ao chão.

Desprenderam-se do fio tênue.
Assim como as vidas se desligam do encanto.

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Festa do branco

Na festa do branco eles se esconderam no fundo da essência,
do prazer,
no profundo sentimento da alegria.
Rodopiaram,
tingiram suas almas de cores leves,
até os fios da cortina da manhã trazerem outro dia.

Eles todos

Quando estão todos juntos, felizes,
não sabem ao certo se devem sorrir
ou manterem-se espantados.
Quando estão sozinhos, temerosos,
não dizem nada, se calam,
e deixam a luz sair de seus olhos,
e os ruídos de seus pensamentos.
Por isso, a cada dia que passa pergunto a eles todos:
o que fazem aí?
E eles espantados,
lentamente,
guardam o sorriso embaixo do braço
.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Descoberta

O encantamento reside entre o que se acredita e o que se fantasia.
E é nisso que sentimos a tênue linha do desconhecido.
Por isso, enquanto não sabemos o caminho,
é bom escolher entre o que é fácil e o que é certo,

e torcer para que não descarrilhemos o movimento das melhores coisas da vida.

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Complexa rota

Na preocupante queda da noite
Jogam-se os efeitos colaterais.

É um sinal de alerta.
Os céticos querem reduzir os riscos
Das viagens, das rotas
e estimulam o recolhimento.
E os otimistas jogam ao chão
Tudo que é uso compartilhado:
do susto à inofensiva abertura do dia.

A timidez

Remexo, mexo, revejo
roupas íntimas.
Vasculho, mergulho
me deixo,
numa gaveta
perdida, cerzida,
sem eixo.
Sem pudor me vejo
dançando sem jeito,
diante de um espelho.

Brincadeira

O tucano esconde
O canto martelo
No bico amarelo
com ares de conde!

Os anjos do contra

Todos os anjos que aí estão
Repousando em meus ombros,
Ficam sorrindo.
Eu, só rindo deles!

Menina

Sua delicadeza passa por todos e chega antes de seu falar.
O som que vem dela coloca à mesa suas dúvidas, suas críticas.

Mas as pessoas só percebem o sentimento que emana do seu olhar.
Pois nele se revela a sensível menina que procura muito mais,

do que a vida está a lhe mostrar.

Angustia

Se a angústia arrebata o encanto, nada mais resta.
Nada mais se constrói, e o sorriso,
Companheiro da alma leve,
Dificilmente sobreviverá
Pois a alma assim,
Encostada num canto do corpo
Não será capaz de puxar as linhas para que o sorriso seja desenhado no rosto.

Segura no ar

A lua despencou do céu.
Escorregou e escondeu-se atrás do limite do olhar.
O céu que a continha não pode segurá-la.
A montanha fez de conta que nada via.
Nada fez para mantê-la no ar e somente decidiu ver a noite chegar.

Vorazes vozes

Tecem sabores os fios das velozes
e espremidas vozes nas ondas do ar.
A teia que trama a trama do falar
É a que salta das veias, das vozes aflitas,
lanças surdas e ferozes.
Nem sequer percebem
que ferem os odores,
que estrangulam os olhares.

São ausentes palavras, sensatas,
constantes risos, secos,
e os retrozes que desenrolam,
das vozes, os fios da angústia, do sabor,
emaranhados,
nos pequenos ossos do ouvir.

Mas num único instante,
os olhares interiores,
paralizados diante das
surpresas gastronômicas
calam as vozes,
olham para o prazer,
para os talheres.
Os aromas penetrantes
expulsam as vozes e
fazem emergir o silencio
das almas, no jantar.